bola de ódio / bola de amor
O primeiro murro parte-me a mão. Sinto os dedos contorcerem-se de dor contra a parede, desviados do seu rumo natural. O branco sujo pelos anos enche-se de sangue, num borrão vermelho. Sei que soltei um grito. Dois segundos depois, um outro murro acerta em cheio no tecto das águas-furtadas. A madeira estala, mas não a mão, esta aguentou o choque. Sem conseguir firmar um punho, agarro na televisão, no despertador, na impressora. Um a um, atiro-os a todos contra a mancha vermelha, como se de um alvo se tratasse. É o meu sangue que ali está, sou eu o alvo. Ao pontapé, destruo as portas do armário até sentir os dedos esfolar. É então que caio. Os joelhos acertam no chão com um baque mal abafado, o som a ecoar pelas paredes e pelos meus ouvidos. Aquele baque enlouquece-me. A mão esquerda, a que não está partida, acerta-me no peito, no rosto, nas costelas. A mão direita pede-me que pare, já chega, pára, pára, por favor, pára. E a mão esquerda obedece. Mas não totalmente. Agora esmurro o chão, como se da minha cara se tratasse, como se aquele soalho fosse a minha pele, os meus ossos e dentes, o meu ser.
E ela bate.
Sem parar.
Uma vez.
E outra.
E mais outra.
É a minha pele que rasga.
São os ossos da minha mão que partem.
Sou eu que grito. De dor. De mágoa. De ódio. E bato.
Sou eu que me imploro para parar, com as lágrimas a cair como chuva.
Pára.
Pára, por favor.
Já chega.
Pára.
Caio…
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