Conto em Cabo Verde - parte I
- Uma hora. Mais uma hora e tudo se precipita. – ele remexe o saco; passa por óculos de sol, livro e maços de lenços – De que é que estou à procura? – pára um instante – De nada, quero é guardar o que tenho. Apesar do travessão, esta frase não foi dita, foi, sim, pensada, sentida, acima de tudo. Este é o último dia das férias que passou em Cabo Verde, ironicamente, o dia mais azul e limpo da semana. O vento sopra, como de costume, mas a falta de nuvens faz com que o calor que se imagina típico de África se faça sentir com mais intensidade. Mas este é apenas um momento de um dia de uma semana de férias. A história começou vários dias antes e nenhuma história deve começar pelo fim, isso é batota. … Acordou às 05h30 de uma quinta-feira. O pai, na noite anterior, dissera-lhe que às 06h00 teria de estar a pé, o táxi apanhava-os às 06h15 para seguirem para a estação de Campanhã. Estamos, portanto, no Porto, em casa de uma família que se prepara para ir de férias para Cabo Verde, como, de resto, já tínhamos visto graças à tal batota de começar pelo fim. Acordou, com aquele nervoso miudinho de quem enfrenta um voo um pouco mais longo, quatro horas não será um tempo infinito para uma viagem de avião, mas já há muito tempo que não fazia férias prolongadas com os pais. Há coisa de oito anos, mais ou menos. - Isto não vai correr nada bem. - disse ele para a almofada. Ao fim de alguns segundos – Vá, sabes bem que queres ir, tira o cu da cama e veste-te, amanhã já estás na praia com as mocambas! – esta palavra valera-lhe uma repreensão de um amigo e arrancara gargalhadas de uma amiga. Ao primeiro lembrou que não era racista e que aquilo era só uma brincadeira, à segunda não disse nada, simplesmente cantarolou “Diga bom dia à mocamba, mocamba, mocamba!”, imitando um qualquer anúncio de uma qualquer bebida servida ao pequeno-almoço. Vestiu-se então e, por um instante, não pensou na viagem. Desceu. Tomou o pequeno-almoço com os pais, quase sem dizer palavra, a esta hora ainda podia refugiar-se no sono. O táxi lá apareceu. … Alfa-pendular. Não se lembrava de alguma vez ter usado esse comboio específico. Em pequeno, tentando, mais uma vez, contar a história de início, enjoava ao mínimo baloiçar. Tinha vómitos quando a mãe usava cotonetes para lhe limpar os ouvidos. No carro, quando os pais visitavam amigos da região perdida de Entre-os-rios, havia uma clareira junto à estrada onde era obrigatório parar, não para respirar ar puro e apreciar a deliciosa vista sobre o Douro, mas para vomitar. Repetidamente. Sonoramente. Quase inexplicavelmente. Alfa-pendular. Meia hora depois de o comboio partir, concluiu, sem margem para dúvidas – O “pendular” é por causa da merda do baloiçar. – A adolescência, as viagens para a universidade, a capacidade de abstracção que foi adquirindo, trouxeram-lhe alívio aos problemas com o enjoo. O alfa-pendular fê-lo sentir que tinha outra vez 10 anos. Duas horas e meia de solavancos, de calores e suores frios em simultâneo, de não saber se ia melhor de pé, sentado, junto ao ar-condicionado, trancado na casa-de-banho, o comboio a abanar, a sacudir, para cá, para lá, agora arranca, agora abranda, depois acelera, sacode, esquerda, direita, abranda, esquerda, direita, acelera, esquerda, direita, cambaleia para a casa-de-banho, esquerda, vomita, direita, vomita, esquerda, lava a boca, direita, vomita. Sentia a cara e as costas geladas e os braços e as pernas a escaldar. Por fim, tudo parou. Em Lisboa, pois claro. Em Santa Apolónia, porque não? O avião estava à distância de um táxi. …
2 comentários:
welcomme back!
que bommmmmmmmmmmmm... part 1 implica muitas partes a seguir hiihihihihi esperemos que muitas mesmo e a avaliar pela primeira parte esta serie de diário de bordo promete ;)
xiiii se enjoas essa viagem de pendular deve ter sido terrivel, a única vez q andei de pendular o embalo deve ter sido tanto que adormeci.
bem, vou ficar em curiosidades á espera dos próximos capitulos que espero que sejam capitulos felizes, era bom ;)
beijokas
e...boa noita com mokamba hihihiihihihiihihihihihihi
olá! Bem, estou a ver que tenho pelo menos uma fã contente! Bem bom.;)
A parte do pendular, infelizmente, pertence aos cerca de 40% de realidade do conto... :( Terrível!
Mocamba, mocamba... eheheheh
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